"A unanimidade é burra", disse Nelson Rodrigues.
Dia desses eu assisti perplexo ao circo que se formou ao redor do crime ocorrido em Santo André, no qual um garoto, sem antecedentes criminais, foi acusado de fazer sua namorada e amiga de reféns por dias e, diante da total inépcia da polícia, acabar por matar a menina e ferir sua amiga. Me refiro ao caso de Lindemberg Alves, cuja condenação foi de 98 anos de reclusão.
Sem entrar no mérito da questão e sem mitigar o mal que esse rapaz propagou, é fato que estamos diante de um crime passional que jamais teria se concretizado caso a polícia tivesse o mínimo de perícia na condução da questão, agido concreta e eficazmente como se vê em outros países desenvolvidos.
Foi um crime que merecia resposta ao grupo social e à família sem perder de vistas que se o intento do acusado era mesmo o de matar ele o teria feito muito antes e, quem sabe, longe dos olhos de testemunhas, como o fazem os homicidas em crimes premeditados.
Não obstante, os meios de comunicação transmitiram à exaustão todo o julgamento do rapaz. As ruas e o fórum de Santo André ficaram totalmente lotados de gente que não tinha o que fazer, supostamente comovidos pela questão e que lutavam por sangue.
A unanimidade queria o linchamento moral do motoboy e de sua advogada...e a obteve com uma sentença indiscutivelmente desproporcional.
Dias depois ocorreu quase em silêncio o julgamento de outro crime! Comoção? Nenhuma. Rigor, nenhum. Ampla cobertura dos meios de comunicação? Zero.
Ademir Oliveira Rosário, conhecido como Maníaco da Cantareira, foi
condenado nesta última terça-feira a 57 anos de prisão por homicídios
qualificados e estupros contra os irmãos Francisco e Josenildo José de
Olveira, respectivamente 14 e 13 anos de idade, assassinados a facadas
em setembro de 2007, na Serra da Cantareira, em São Paulo.
As vítimas desapareceram em setembro de 2007, na Serra da
Cantareira, na capital paulista, após avisarem a mãe que iriam colher
frutas em uma chácara na região. Os corpos foram encontrados três dias
depois, a uma distância de 100 m um do outro. Os meninos estavam nus e
tinham marcas de perfurações provocadas por objeto cortante.
A polícia localizou os corpos após três garotos denunciarem que, no
mesmo dia do desaparecimento dos irmãos, um homem que fingiu estar
armado ordenou que o trio o acompanhasse na mata. Os meninos disseram
que o homem tentou amarrá-los em árvores, mas conseguiram fugir quando
perceberam que ele não portava arma.
Um dia depois, um suspeito foi preso. Ademir Oliveira Rosário, então
com 36 anos, era morador da região e cumpria pena em regime semiaberto
por homicídio e atentado violento ao pudor. Ele teve permissão para
deixar o presídio na sexta-feira, véspera do crime, e voltar na
segunda-feira - e o fez.
Na época, a polícia informou que ele confessou
os homicídios.
Estamos nitidamente diante de uma sociedade doente, desproporcionalmente vingativa e cega, na qual a opinião pública relega um crime bárbaro e cruel e se apega a outro passional. Na qual um sujeito reincidente em práticas contra a vida e contra a moral ataca deliberadamente contra a vida e contra a sexualidade de dois adolescentes e recebe menos pena do que outro que agiu sob o efeito de seu desequilibrio emocional. Devemos rever nossos conceitos urgentemente porque estamos num país em que os valores estão de cabeça para baixo.
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