terça-feira, 15 de março de 2011

Ataraxia

Diz o léxico que a palavra deriva da filosofia e signfica "quietude absoluta da alma, quietude que é, segundo o epicurismo, o apanágio dos deuses e o ideal do sábio."

Mas também significa apatia e despreocupação extremada e patológica com os fatos da vida.

Interessante isso: de um lado o ápice da elevação espiritual que conduz à tranquilidade inabalável, de outro, uma patologia que impede alguém de ter a mínima preocupação com seja lá o que for.

Muita gente anda por aí confundindo isso com paz, confundindo isso com medo, confundindo isso com perdão e confundindo isso com urbanidade e cidadania: não se preocupam com as ofensas que o vizinho pratica em sua casa contra seu filho e esposa porque isso é um problema dele; não se preocupam com as agressões que brutamontes fazem contra outros na rua porque isso é um problema dos outros e nem mesmo reagem quando alguém lhes ofende porque imaginam que a reação lhes trará maior desprazer, sobretudo se a reação - para ser a altura do agressor - envolve certa dose de brutalidade!

Dia desses, um troglodita, moleque, desses marombados, por um motivo banal, fútil mesmo, e do qual ele não tinha qualquer razão (nem objetiva e nem subjetivamente falando), passou a gritar comigo e me desrespeitar na rua, em frente a todos. Reagi à altura, sem medo. Ele não ficou feliz e, como se sua massa muscular pudesse darantir-lhe sucesso, saiu do carro em minha direção numa atitude hostil, com palavras pouco urbanas, na tentativa de me intimidar. Não consegiu!

Gritar em público, reagir com violência, falar palavras de baixo calão não é urbano e tampouco é algo de que devemos nos orgulhar. Mas há situações extremadas em que essa reação é a única disponível para manter o respeito, não se deixar acuar e proteger sua moral, sua dignidade, sua civilidade, seus direitos, ou seja, sua vida não material prestes a ser jogada na sarjeta.

Há quem peça desculpas até mesmo quando recebe um tapa na cara! Há quem se intimide e saia correndo. Geralmente eu não reajo assim: se eu permitir que alguém faça comigo algo que reputo desonrosso e mesmo assim fico quieto então, na verdade, eu fortaleci o agressor.

Essa postura de subserveniência e de omissão diante da violência não é NÃO VIOLÊNCIA, tampouco é de elevação espiritual, isso é ataraxia social e moral! Isso é covardia que reforça a impunidade e resulta, depois, em atitudes extremadas como aquela do atropleamento dos ciclistas dentre outras.

Fique apático diante da violência e verá que ela se tornará maior e, ainda assim, voltará contra você. Justamente aquilo que se queria evitar. O pior é que a omissão nos torna cúmplices do agressor.

A cultura do é melhor um covarde vivo a um herói morto é indecente e faz de nós um bando de escravos de uma vida indgna de ser vivida.

Segue um trecho do filme APOCALYPTO sobre o medo, sobre a omissão, sobre a doença que é essa ataraxia que vemos hoje em nosso povo:


O texto está em inglês mas é bem fácil de entender.

8 comentários:

  1. Engraçado, seu texto me lembrou uma coisa que eu estava lendo esses dias... eu estava pesquisando sobre os amish americanos, e o caso daquele cara que entrou numa escola e matou crianças e depois se suicidou. As famílias das crianças foram até a do assassino, pra dizer que o perdoavam. Ataraxia ou alienação?

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  2. A questão do perdão é um pouco mais profunda: quando alguém perdoa, na verdade, não endereça seu perdão ao outro mas a si mesmo.

    Afinal, o perdão retira dos ombros de quem perdoa, o peso de se manter ligado ao agressor pela raiva, pelo ódio, pela ofensa.

    Claro que perdão não elimina a reação. Para toda ofensa cabe uma retorção (reação na medida para fazer cessar a violência) e/ou uma reparação.

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  3. "A cultura do é melhor um covarde vivo a um herói morto é indecente e faz de nós um bando de escravos de uma vida indigna de ser vivida." Concordo, eu sou A "chata" em todos os níveis, minhas filhas sempre mandam eu ficar quieta, seja em transito, loja ou outro lugar.Acredito que a mídia em geral faz com que o medo e a passividade seja cada vez mais enfatizada,pois só mostram as vítimas !
    Só um caso: Estava numa fila imensa em um banco, quando um rapazinho saí lá de trás e pede a alguém que conhecia lá na frente para pagar um monte de contas. Ah, pra quê? Chamei a atenção, falei prá ca**** e o rapazinho bem robusto resolveu se fazer de macho aos gritos, chamei gerente, segurança e o fotografei com o celular. Ele acabou pegando as contas e saindo. Todos que estavam na fila (umas 40 pessoas) que não se pronunciaram durante a discussão, quando o rapaz saiu do banco, disseram que eu estava coberta de razão mas corria o risco dele me agredir na rua.Eu já mais que p* da vida disse que se fosse agredida ia chamar todo mundo como testemunha, resultado: deixaram de falar e fingiam que não me viam, pois eu podia pedir nome e endereço!
    Final da historia, levei a maior bronca das filhas! Cidadania e educação é algo a ser exercido todos os dias para que nossos direitos sejam respeitados.
    Quase virou um post.
    bjs
    Jussara

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  4. Oi A. Marcos, como você mesmo disse, muitas pessoas preferem a apatia a reação quando se deparam com a violência ou a injustiça e acredito também que muitos vezes isso pode reforçar as relações de poder.
    Mas de outro modo, vemos pessoas morrerem estupidamente em discussões no trânsito ou algo do tipo e fica a questão.

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  5. Essas mortes só ocorrem porque a massa é inerte, passiva e não reage à violência.

    Se alguém é ofendido o que ele deve fazer? Procurar as autoridades constituídas e buscar a satisfação, a reparação a ofensa. Mas a sensação de impunidade e a falata de efetividade dessas autoridades desestimula o cidadão de bem e estimula os párias.

    Diante desse panorama, cabe à sociedade reagir à primeira agressão (política) dos modos já discutidos noutros tópicos e reagir à sefunda agressão (social).

    Uma pessoa pode tirar a vida de outra com um tiro, por exemplo. Mas conseguirá tirar a vida de uma massa enfurecida de pessoas? Não! Um revolver tem seis projéteis e uma pistola 14. E o agressor tem, antes de mais nada, amor à própria vida.

    O problema é que a maior parte das pessoas não andam armadas. E a maior parte das violências do dia a dia não são atos de barbárie mas de desrespeito a simples direitos. Atos de arrogância, prepotência e falta de urbanidade, como se deu comigo e com a Jussara. Seus autores se alimentam da covardia dos outros. Intimidam mas quando confrontados não seguem adiante. Imagine, se confrontados por uma massa de pessoas ao invés de uma só?

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  6. O silêncio favorece o opressor e não o oprimido... particularmente eu tenho dificuldade de manter minha boca fechada...

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  7. Lembrei do hit da net: zangief kid.


    Assistiu?

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